Saturday, January 12, 2013

A cidade-postal do amor

"Sous le ciel de Paris marchent les amoureux"

    Mur des je t’aime, Place Abbesses, Montmartre, Paris 

Diante do “Mur des je t’aime”, na Place Abbesses, no Montmartre, casais param para selar um beijo e se fazerem fotografar. Trata-se de um painel onde se lê “amo-te” nos mais variados idiomas, e que é um ponto turístico incontornável para os apaixonados que visitam Paris. O “Mur des je t’aime” figura como mais um postal da cité de l’amour.

Há um imaginário romântico fortemente vinculado à cidade de Paris e que é amplamente difundido por diversos produtos culturais mediáticos. A publicidade de Paris, como destino turístico, remete frequentemente ao amor. Esta construção mental e atmosfera romântica que paira sobre a cidade foi engendrada e sedimentada culturalmente ao longo de alguns séculos, criando um estado de espírito e uma pré-disposição que é capaz de interferir na percepção e na experiência dos sujeitos na cidade.

As inovações tecnológicas ocorridas na segunda metade de 1900, sobretudo no que tange ao desenvolvimento dos meios de transporte, influenciaram positivamente o aumento progressivo do turismo de massa, que foi fortalecido pela criação do período de férias e também pela generalização do costume das viagens de lua-de-mel. Nesta altura, a capital do século XIX já era um destino cativo. O postal ilustrado desempenhou um relevante papel durante a alta atividade turística deste período, sendo um elemento quase indissociável das viagens. Tecnologia de criação do imaginário, o postal carrega signos que transmitem uma imagem tal de uma cidade. A imagem de um lugar impressa no postal é uma representação, um discurso sobre a cidade, sobre a região, ou sobre o país. Deste modo, o postal contribui para constituir “um corpo de imagens que passa a ser entendido como o portifolio de creditação e disciplina iconográfica dos trechos que se impunham como os mais ofertáveis da cidade” (Bandeira, 2007). Nesta perspectiva, o ambiente urbano, material e subjetivo, simultaneamente produz e faz circular significados, mas também se dá, ele próprio, a consumir pelos sentidos.

No caso de Paris, pode-se dizer que estes trechos mais ofertáveis (e mesmo os não tão ofertáveis assim) são revestidos por uma atmosfera que encoraja o comportamento amoroso com estímulos textuais, visuais, sonoros, olfativos, gestuais e paisagísticos que fazem parte do imaginário do amor romântico – o que poderia ser abordado de acordo com a perspectiva de análise da semiótica social e da multimodalidade. Os monumentos e pontos turísticos exaustivamente fotografados, ilustrados, pintados, e reproduzidos em postais servem de cenário para as fotografias de casais, imagens que depois se tornam, elas próprias, postais da cidade.

Com uma rápida pesquisa exploratória pelos quiosques de turismo ou pelas lojas de souvenirs, vê-se que nos postais que vendem uma Paris romântica, a repetição de alguns signos constituem uma gramática visual do amor – composta pela predominância de certos elementos e composições para a construção dos discursos, como é o caso das recorrentes fotografias em preto e branco, com a imagem de um casal enlaçado ou envolvido num beijo, muitas vezes com a Torre Eiffel ao fundo. 

Estes postais do amor, reproduzem um discurso recorrente sobre a cidade de Paris que está presente em filmes, músicas, livros, guias comerciais de turismo, etc. Mas estes postais também captam o que circula no imaginário social, pois correspondem a um determinado estado de espírito de disposição romântica, que se reproduz e se dissemina em imagem, mas também em comportamento.


Série de postais à venda em quiosque em frente ao Centre Pompidou, Paris



Cadeados do amor na Pont Neuf, em Paris
Fontes:
Bandeira, Miguel Sopas de Melo (2007) Memória e paisagem urbana: a construção da imagem patrimonial de Braga desde acervos ilustrados e fotográficos de referência. Comunicação apresentada na Conferência Imagem e Pensamento – Conferência Internacional em Lisboa. Museu Colecção Berardo, org. Centro de Estudos de Comunicação e Linguagem / Centro de Estudos de Comunicação e Sociedade.
Aiello, Giorgia (2010) From wound to enclave: the visual-material performance of urban renewal in Bologna’s Manifattura delle Arti In Western Journal of Communication. http://mc.manuscriptcentral.com/rwjc

No comments: