Recebido do Rogério Madeira, um antigo estudante que nos faz sentir realizados com o ofício de professor... aquele que sempre estimula a curiosidade...
Caro prof. Bandeira.
Como está?
Recentemente andei em viagem e levei comigo um livrinho para ler.
Um livro que estava esquecido nas minhas prateleiras e que só peguei nele por ser um livro "fácil de ler" (tem poucas páginas!).
"As Cidades Invisíveis" de Italo Calvino...
Cidades invisíveis que são bem visíveis... ;)
Gostaria de transcrever um dos breves capítulos
(...)
(...)
"As cidades e a memória. 5.
Em Maurília, o viajante é convidado a visitar a cidade e ao mesmo tempo a observar certos velhos postais ilustrados que a representam como era dantes: a mesma idêntica praça com uma galinha no lugar da estação dos autocarros, o coreto da música no lugar do viaduto, duas meninas de sombrinha branca no lugar da fábrica de explosivos. Para não desiludir os habitantes o viajante tem de gabar a cidade nos postais e preferi-la à presente, com o cuidado porém de conter o seu desgosto pelas mudanças dentro de regras bem precisas: reconhecendo que a magnificência e prosperidade de Maurília transformada em metrópole, se comparadas com a velha Maurília provinciana, não compensam uma certa graça perdida, a qual contudo só poderá ser gozada agora nos velhos postais, enquanto outrora, com a Maurília provinciana debaixo de olhos, de gracioso não se via mesmo nada, e igualmente não se veria hoje se Maurília houvesse permanecido tal e qual, e que no entanto a metrópole tem mais esta atracção, que através do que se tornou se pode repensar com nostalgia no que era.
E nem pensem em dizer-lhes que por vezes se sucedem cidades diferentes sobre o mesmo chão e sob o mesmo nome, nascem e morrem sem se terem conhecido, incomunicáveis entre si. Às vezes até os nomes dos habitantes permanecem iguais, e o sotaque das vozes, e até mesmo o delineamentos dos rostos; mas os deuses que habitam debaixo dos nomes e sobre os locais partiram sem dizer nada a ninguém e no seu lugar aninharam-se deuses estranhos. É inútil interrogarmo-nos se estes são melhores ou piores que os antigos, dado que não existe entre eles nenhuma relação, tal como os velhos postais não representam Maurília como era, mas sim outra cidade que por acaso se chamava Maurília como esta."
CALVINO, Italo (1990), "As Cidades Invisíveis", Colecção Estórias, Editorial Teorema, pp. 33-34.
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