Tuesday, April 9, 2013

Os Portugueses na primeira Grande Mundial. A reportagem de Arnaldo Garcez, fotógrafo do C.E.P.


Arnaldo Garcez (Serviço Photographico do C.E.P. / Lévy & Fils C.ie Paris) – Os Portuguezes em França. Revista d’uma brigada.



Hoje comemora-se o 95.º aniversário da batalha de La Lys. Um violento confronto de divisões do exército britânico e batalhões portugueses com o exército alemão, que neste dia saiu vitorioso. Desde então, todos os anos se realizam cerimónias memoriais no cemitério militar português de Richebourg, e junto ao monumento de La Couture, onde se reúnem militares e civis para prestar homenagem aos nossos soldados. La Lys foi uma das batalhas travadas entre os aliados e os alemães durante a Ofensiva da Primavera, planeada pelo general Ludendorff, que ficou conhecida pelo nome de código Operação Georgette (ca. 7 a 29 de Abril de 1918). O objectivo alemão era quebrar as linhas defensivas e obrigar os britânicos, posicionados naquela zona da Flandres, a recuar até aos portos do Canal da Mancha e, em última análise, à sua retirada de França e da guerra. Por esta altura a 1.ª Companhia do Contingente Expedicionário Português já tinha retirado da frente, e a 2.ª tinha sido informada que ia retirar, pouco tempo antes do ataque alemão. Os portugueses, fatigados de uma longa luta nas trincheiras e com a moral pouco elevada, resistiram como puderam. Entre mortos, desaparecidos e aprisionados, nesta batalha os portugueses perderam cerca de 300 oficiais e 7000 soldados, alguns dos quais nunca chegaram a ser identificados. Apesar disso, ficaram registados actos de extraordinária bravura, e a acção portuguesa contribuiu para limitar as consequências da ofensiva alemã. Nas batalhas que se seguiram os aliados conseguiram conter o seu avanço em direcção à costa e, no dia 29, os alemães cancelaram a Operação Georgette [1]. 



Arnaldo Garcez (Serviço Photographico do C.E.P. / Lévy & Fils C.ie, Paris) - Os Portuguezes na frente de batalha. Bateria a caminho das linhas.


Do vasto trabalho fotográfico de Arnaldo Garcez Rodrigues como fotógrafo oficial no Serviço Photographico do Contingente Expedicionário Portuguez, desde a preparação das tropas em Portugal até ao final da nossa participação na primeira guerra mundial (Julho de 1916 - ca. 1919) [2], foram impressas três séries de 24 bilhetes postais num total de 72 [3], com legendas em português e em francês, que registam momentos significativos da nossa presença e acções na 1.ª Grande Guerra, constituindo uma narrativa visual, politicamente correcta e certamente supervisionada, dessa acção militar. Os únicos exemplares circulados de que temos notícia datam de finais de Janeiro e de Fevereiro de 1918 [4], o que nos leva a supor estas séries foram editadas a partir de cerca de finais de 1917 ou Janeiro de 1918, e pelo menos até Julho de 1918 [5]. Aparecem com alguma frequência exemplares desta edição que foram usados com fins publicitários pela marca de calçado Portugal, possivelmente a fornecedora de calçado às tropas, com um carimbo vermelho sobreposto, nem sempre criando associações semânticas felizes entre imagem e texto...



Garcez, Arnaldo (Serviço Photographico do C.E.P. / Lévy & Fils C.ie, Paris) - Sector Portuguez. Zona devastada. Le Touret.- Sepultura portugueza, com carimbo do calçado Portugal.


A correspondência dos soldados portugueses que combatiam em França, através de bilhetes postais, foi sobretudo feita usando edições francesas, quer ilustradas com imagens relacionadas com a guerra, quer sem qualquer relação com ela. Se tomarmos como credível a informação da circulação de alguns exemplares da série de postais impressos com fotografias de Garcez em Janeiro e Fevereiro de 1918 [6], o facto leva-nos a supor que não devem ter sido vendidos próximo da frente de batalha, ou que, por qualquer outro motivo, os soldados portugueses quase não tiveram acesso a eles, justificando a sua escassa circulação. Assim, mais do que suporte para a correspondência de guerra, eles terão passado rapidamente para a categoria de memorabilia, constituindo uma memória visual da nossa presença na 1.ª Guerra Mundial.



1. Henriques, Mendo Castro & Leitão, António Rosas (2001) La Lys – 1918 – Os Soldados desconhecidos, Lisboa: Prefácio;
'Battle of La Lys (1918)'. Wikipedia, the free encyclopedia,
'Corpo Expedicionário Português'. Wikipedia, a enciclopédia livre.
‘Portugal na Primeira Guerra Mundial, Wikipedia, a enciclopédia livre,
2. Vicente, António Pedro (2000) Arnaldo Garcez: Um repórter fotográfico na 1ª Grande Guerra. Porto: Centro Português de Fotografia.
3. Três séries de 24 bilhetes postais (segundo informação obtida por Pedro Barros, coleccionador) com os títulos "Os Portuguezes em França", que mostra a presença e as manobras do C.E.P na Flandres, bem como a componente social da nossa acção (quer os contactos militares com as chefias aliadas, quer as nossas acções de evacuação e apoio à população local), "Os Portugueses na Frente de Batalha", que regista de forma positiva e selectiva o quotidiano dos nossos soldados na frente de batalha, e o "Sector Portuguez", que regista os efeitos destrutivos da acção inimiga na área defendida pelos portugueses. Segundo Vicente (2000: 12) a edição conta, no total, com 75 bilhetes postais. Foram impressos em fototipia, pela firma parisiense Lévy Fils & C.ie, herdeira de um estabelecimento familiar que editou vistas fotográficas de Portugal, desde cerca dos anos 60 do séc. XIX, e as comercializou em França e em Portugal.
4. Sousa, Vicente & Jacob, Neto (1985) Portugal no 1.º quartel do Séc. XX, documentado pelo bilhete postal ilustrado da 1.ª Exposição Nacional de Postais Antigos. Bragança: Câmara Municipal de Bragança, pp. 366-367.
5. Bilhetes postais intitulados 'Paris.- 14 de julho de 1918. Desfile dos portuguezes.', da série Os Portuguezes em França.
6. Id, nota 4.







No comments: