"A verdadeira linguagem dos sellos". Bilhete-postal ilustrado editado em língua portuguesa,
e circulado em Portugal em 1904 (col. particular) [1].
Se hoje não se pode tomar como
regra a protecção da reputação das meninas solteiras das "bocas do
mundo", há um século era uma preocupação comum a qualquer pai ou mãe que quisesse o bem de uma
filha. Apesar de todos os cuidados, o enamoramento, o desejo ou mesmo o amor
eram, e continuam a ser, uma aventura arriscada do espírito e da carne que nem
sempre acaba bem.
A proibição da convivência em
privado, levou ao uso de recursos engenhosos para transmitir o que não era
permitido dizer. Usar o piscar de olhos para comunicar em código poderia levar a visitas frequentes ao
médico e a uma fama de tique nervoso, que em sociedade não auguraria bom
partido a uma menina que se queria bem casada. Em alternativa, a limitação da
liberdade de comunicação, levou à criação de alguns códigos discretos como o
dos leques, o das flores, o dos perfumes, e o dos selos, que permitiam
comunicar o essencial entre quem se queria bem e desejava mais.
O código dos selos de correio foi
difundido no ocidente, através de bilhetes postais impressos para o efeito, a
partir do início do século XX. É claro que, não havendo um código universal da
comunicação através dos selos,
mas vários, ambos os correspondentes tinham de adoptar um código comum.
Em algum momento da sua relação um dos enamorados teria de passar a chave ao
outro, num postal ou em cópia fidedigna, e, mesmo assim, um engano podia levar
uma menina comprometida a entreabrir a porta do seu coração.
Sendo um código necessariamente
limitado, através dele ficamos a saber que no namoro o essencial é saber se
ambos se amam, se não vão cair no esquecimento do outro, se irão poder ver-se
em breve, e, sobretudo, receber
um "sim", a palavra que mais se espera num romance, e a que
mais é de temer entre quem se conhece mal.
1. Edição impressa em Florença pelo Stab. Grafico C. A. Materassi / Pia Casa di Lavoro, e elaborada a partir do postal "Le seul language
des timbres-poste", editado em Bruxelas, do qual conhecemos exemplares
circulados em 1900.
1 comment:
que bela estreia, Nuno!
o essencial era, e continua a ser, os enamorados falarem a mesma linguagem - como se diz hoje, estarem em sintonia! ;-)
(o privado que fala publicamente)
Post a Comment