Saturday, July 12, 2008

Parlez-moi d’amour avec des fautes d’orthographe


«É urgente inventar a alegria,
multiplicar os beijos, as searas,
é urgente descobrir rosas e rios
e manhãs claras». Eugénio de Andrade em Até Amanhã (1951-1956).

Não vamos encontrar versos assim inspirados nos postais de amor de que se ocupa Henri Joannis-Deberne. A poesia é neles estereotipada e a escrita é mesmo deficiente. Todavia, diz Joannis-Deberne, «os erros ortográficos estão para o postal de amor como a merguez está para o cuscuz, uma vez que lhe dá picante, sabor e autenticidade» (p.23). Pois não serei eu a contrariá-lo.

Parlez-moi d’amour avec des fautes d’orthographe foi editado pela Payot, já este ano de 2008. Remete para um universo de mais de duzentos postais, comprados em feiras da ladra, com datas que vão de 1900 a 1930. O autor projectou este livro como um devaneio, que acompanha o jogo amoroso em França, através das imagens e das palavras dos postais. Pelo domínio da prática da escrita entre os correspondentes, Joannis-Deberne procura estabelecer a categoria sociocultural a que pertencem, os seus sistemas de valores, a audácia e a timidez de que dão mostras, e ainda o peso da moral católica.

Este ensaio sobre os postais assinala, por outro lado, um trajecto através de várias correntes estéticas populares, que por exemplo declinavam a distinção e o chique colocando em cena (fotográfica) cavalheiros elegantes, de colarinhos engomados, e meninas de olhar tímido e fartas cabeleiras de caracóis.

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